sábado, 14 de maio de 2011

Covilhã - Contributos para a sua História dos Lanifícios - II

Os Panos estrangeiros em Portugal

Nos primeiros tempos da monarquia o mercado português de panos era alimentado por tecidos estrangeiros. Só o burel nos aparece nos documentos da época como de possível fabricação nacional e este mesmo não passaria de uma rudimentar fabricação caseira para as necessidades familiares e, quando muito, para o mercado local. As classes nobres e eclesiásticas vestiam sempre panos estrangeiros.
Estes panos, trazidos primitivamente da Flandres, cujos mercadores frequentavam os nossos portos, quando a marinha mercante deste país decaiu, seriam procurados por comerciantes portugueses que frequentavam as suas feiras, cidades e vilas industriais.
Os panos ingleses e franceses só viriam mais tarde, sobretudo os primeiros. A partir de Eduardo III as lãs inglesas permaneceram então na Grã-Bretanha para alimentar a indústria própria, substituindo-as no mercado flamengo as lãs espanholas e, consequentemente, as lãs portuguesas, que os forais, contratos e outros documentos primitivos nos ensinam serem aproveitadas e transaccionadas.
Daqui provém a circunstância de muitos documentos medievais nos referirem as espécies de panos que corriam nos nossos mercados e feiras para entrarem nas alfândegas dos portos marítimos e serem taxadas pelas leis fiscais. Delas se conclui que o mercado era abundante, as transacções variadas e as qualidades tantas que no emaranhado da classificação e da nomenclatura torna-se sempre difícil distinguir a fibra dos tecidos e a bondade do pano. Uma coisa, no entanto, transparece: a origem desses panos e estofos é marcada, quase sempre, pelo nome da cidade ou do burgo onde eram fabricados. (1)
Ao lado dos panos da Flandres, da Inglaterra e da França cedo figuram os  italianos e espanhóis.
Não houve outras cidades manufactureiras que excedessem em fortuna as da Flandres. Mas logo, com Eduardo III a Grã-Bretanha deixou de vender as suas lãs, para utilizá-las e concorrer com a Flandres no mercado do continente, elevando Stamford.  Depois os Países Baixos, nos fins do século XIV, assistem ao declínio das cidades industriais e à vitória dos meios campesinos. É a hora de Poperinghe, Dixmude, Bergues e Furnes. Bruges cede a sua posição de porto abastecedor de lãs à nova cidade de Antuérpia e as lãs espanholas vão substituir, no mercado flamengo, as lãs inglesas. Os Países Baixos conseguem reimplantar a sua hegemonia perdida com salários mais baixos e novos tecidos, inaugurando uma nova era industrial em pouco tempo, que os equipara aos ingleses. A França e a Alemanha, sobretudo nas comarcas limítrofes da Flandres, desenvolvem-se também no século XIV e impõem os seus tecidos ao gosto europeu, enquanto a Itália do Norte, terra de mercadores e traficantes, senhora de há muito do mercado mediterrânico, alarga as suas indústrias manufactureiras, de que Florença no século anterior fora centro primacial.
Na Espanha, pátria dos merinos, também se instalou cedo uma indústria de tecidos, mas foi preciso que a reconquista alargasse ao sul as suas asas, para que ela florescesse e trabalhasse de novo as suas próprias lãs. De resto já os geógrafos antigos louvaram as lãs espanholas e os lusitanos vencidos entregaram aos romanos, como tributo de guerra, 47.000 mantas. Aos árabes também coube papel decisivo no comércio e na indústria dos panos e a sua técnica marcou a terra peninsular. Não é, pois, de admirar que notícias mais antigas de panos tragam à tona de água a lembrança das manufacturas flamengas e inglesas e, mais tarde, das italianas, francesas e espanholas.


Nota dos editores – 1) Voltaremos a este assunto.

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